Qual a tratamento dispensado ao adolescente autor de ato infracional? A intenção é a de buscar identificar os avanços legais da legislação brasileira e as práticas operacionais que resultam positivamente na reconstrução da vida dos adolescentes. Inicialmente é necessário acentuar que para a atual legislação brasileira, adolescente é a pessoa cuja idade oscila entre os 12 anos completos e os 18 incompletos. Antes disso é criança.
2.1. Quando criança
A criança autora de ato infracional recebe tratamento diferenciado daquele dedicado ao adolescente. Cabe ao Conselho Tutelar aplicar medidas previstas no ECA1. Neste sentido, a legislação está mais voltada à penalização dos pais ou responsáveis do que propriamente às crianças. Entende que existe falha ou omissão no papel dos mesmos. Às medidas:
· tratam do encaminhamento delas aos pais ou responsáveis com termos de responsabilidades;
· orientação e apoio e acompanhamento temporários;
· incluem programas de auxílio à família, ou às crianças;
· requisição de tratamentos em regime hospitalar ou ambulatorial;
· aos pais ou responsáveis a inclusão em programas oficiais de auxílio, orientação e tratamento de alcoólatras e toxicônomos;
· abrigamento;
· colocação em família substituta.
2.2. Quando adolescente
O adolescente, por sua vez, quando infrator é tratado como juridicamente responsável, portanto, sujeito a medidas punitivas de caráter sancionador e a procedimentos processuais jurisdicionais. Essas medidas são chamadas de socioeducativas uma vez que estamos tratando de pessoas em formação e em condição peculiar de desenvolvimento.
Comprovada a prática de ato infracional, o juiz da Vara da Infância e da Adolescência aplicará ao adolescente tais medidas que se dividem em dois grupos distintos2.
2.2.1. Medidas não privativas de liberdade
Estas são medidas que evitam a internação e a conseqüente perda da liberdade. Bastante difundidas, mostram-se muito eficazes quando acompanhadas também por equipe de profissionais comprometidos com a proposta inovadora da lei.
a) Advertência
Esta é a mais branda das medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente autor de ato infracional. Ela se esgota na admoestação feita de forma solene pela autoridade judiciária. É usada, em geral, nos casos de infrações mais leves, ou quando o autor é primário ou quando praticou ocasionalmente uma infração e se presume que esta medida seja suficiente para a correção.
b) Obrigação de reparar o dano
Esta medida busca ser educativa e reparativa do mal causado ao patrimônio. Ela propõe a restituição da coisa, o ressarcimento do dano ou prejuízo econômico ou reparação do prejuízo por qualquer outra forma. É uma medida que tem se mostrado altamente pedagógica tanto pelo caráter compensatório quanto pela carga psicológica positiva que surge da possibilidade de reparação do mal.
c) Prestação de serviços à comunidade
Aqui a autoridade pode determinar um caminho alternativo de correção reconhecendo o valor da pessoa humana presente no infrator. São trabalhos que deverão ser desenvolvidos pelo adolescente, de forma gratuita, cumpridos em determinado local, com horários estabelecidos e por determinado período. São proibidos trabalhos vexatórios, insalubres ou perigosos e somente em entidades em fins lucrativos. Essa medida favorece o desenvolvimento de relações de solidariedade junto a grupos de excluídos sociais, de desvalidos, doentes e idosos. Faz com o adolescente se perceba útil à sociedade e refletir por um período maior sobre a inadequação de sua conduta. São muitas as obras josefinas no Brasil que, mediante convênios com a Vara da Infância e da Juventude, recebem adolescentes para cumprirem essa medida.
d) Liberdade assistida
É uma medida que se executa em meio aberto, mesmo com algumas características que restringem a liberdade. A iniciativa dessa prática é bem anterior ao ECA. Surgiu na cidade de São Paulo, como trabalho da Pastoral do Menor junto aos egressos do sistema FEBEM daquela cidade. Tinha como objetivo garantir o acompanhamento do adolescente através de cristãos voluntários que recebiam preparação para tal. A experiência foi tão positiva que passou a integrar o corpo das medidas aplicados aos infratores previstas no ECA. Com o advento do ECA a Pastoral do Menor tornou-se grande executora dessa medida em várias regiões do país, num trabalho articulado em rede, através de parceria financeira com o Ministério da Justiça. Também essa medida é executada com intervenção de obras josefinas.
Ela pressupõe a nomeação de uma pessoa, de preferência vinculada a programas de atendimento público, para acompanhar o adolescente no cumprimento da medida. A tarefa é a de acompanhar, orientar e auxiliar o adolescente a se dar bem no seu exercício da liberdade e cidadania. Auxilia o adolescente a redimensionar suas atitudes, atividades, valores e sua convivência familiar e comunitária. O juiz continua sendo o controlador da medida e é assistido por equipe técnica sob a responsabilidade de órgão da administração municipal. A Liberdade Assistida, quando executada com eficiência, tem se mostrado como grande responsável pela diminuição dos números de internações ou privações de liberdade.
2.2.1. Medidas privativas de liberdade
O ECA, para os casos de infração de natureza mais grave, ou consideradas ainda a reincidência e os determinantes circunstanciais, prevê a aplicação de duas medidas que privam o adolescente de liberdade. É comum entre os educadores brasileiros a idéia de que se deve evitar ao máximo as medidas privativas de liberdade porque elas, além de onerosas ao Estado e à sociedade, dificultam mais a recuperação ou ressocialização do adolescente.
a) Inserção em regime de semi-liberdade
Esta medida implica em institucionalização. O infrator sujeita-se às regras de uma unidade ou casa de permanência, exercendo atividade externas regulares. Também bastante aplicada pelo Juiz a fim de evitar a internação, a medida se mostra eficiente quando existe uma equipe pedagógica comprometida com a promoção do adolescente.
b) Internação
É a mais “pesada” e a última das medidas socioeducativas. De total privação de liberdade, está sujeita aos princípios da brevidade e da excepcionalidade. Nunca poderá ultrapassar o prazo de três anos3. Deve ser reavaliada a cada seis meses, com apoio de equipe técnica. A lei entende que a aplicação dessa medida além da natureza sancionatória da liberdade, tem caráter educativo pois a mesma deve interagir num processo psicopedagógico de atendimento. Ou seja, trata-se de oferecer em seu interior atividades e programas que auxiliem o adolescente a enfrentar seu processo de retorno à convivência social. Neste sentido a luta brasileira é para que as unidades de internação para os adolescentes não sejam cópias diminuídas do sistema prisional adulto, já condenado e falido no país.
A recomendação geral tanto da lei quando dos operadores do sistema brasileiro de garantia de direitos é de que a internação somente seja aplicada pela autoridade quando esgotadas todas as outras possibilidades de medidas.
É necessário lembrar que o adolescente, durante sua permanência em unidade de internação privativa de liberdade deve ter assegurados seus direitos e seu bem estar.
É preciso esclarecer ainda que a legislação brasileira trata o adolescente autor de ato infracional de forma diferenciada do mundo adulto. Ele é considerado inimputável (excluído da responsabilidade penal do mundo adulto), mas não é impune. Em determinados momentos críticos de deflagração da violência no país ou na análise de casos isolados envolvendo adolescentes, onde a mídia busca mexer com os sentimentos e a opinião pública, surgem movimentos que acreditam que uma das formas de coibir a violência e seus avanços é diminuindo a idade da responsabilidade penal para 16, 14 ou 12 anos. E aí propõem alteração da lei. Alegam eles que nada acontece ao adolescente que comete ato infracional. Porém a execução das medidas socioeducativas provam o contrário4.
Fundamentado nesta idéia é que um bom número de estudiosos da infância, operadores do sistema de garantia de direitos, educadores, movimentos de direitos humanos se mobilizam no país em favor da não redução da idade da responsabilidade penal. Nesta causa entram também os confrades e as obras dos Josefinos do Brasil. Esta tem sido uma deliberação de Seminários e Congressos, bem como, e orientação constante da Equipe da Criança e do Adolescente e da coordenação da Província.
1 Cfr Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal 8069/1990 – Art.101